Extra

Filme ‘Tropa de Elite peruano’ causa polêmica; assista ao trailer

“Chavín de Huántar: O resgate do século” recria a operação militar de 1997 que salvou 72 reféns na casa do embaixador do Japão, mistura realismo bélico com forte patriotismo e é alvo de críticas por viés pró-militares e silêncios sobre Fujimori e denúncias de execuções

05/12/2025 às 10:25 por Redação Plox

“Chavín de Huántar: O resgate do século” estreou nos cinemas peruanos com a mesma estratégia calculada da operação militar que retrata. Lançado com forte barulho, o longa rapidamente ganhou o apelido de “Tropa de Elite peruano” e, em pouco mais de um mês, levou mais de 1 milhão de espectadores às salas, entrando para o top 5 de maiores bilheterias da história do país.


A forte resposta do público se explica em parte pelo apelo da história real: o filme reencena o resgate de 72 reféns mantidos na residência do embaixador do Japão, em Lima, em 1997, episódio que ainda hoje é motivo de orgulho nacional no Peru.


Mas a produção vai além de explosões, túneis, maquetes e treinamento militar que lembram, em alguns momentos, o filme estrelado por Wagner Moura. Ainda sem previsão de estreia no Brasil, “Chavín de Huántar” desencadeou um embate intenso entre quem o enxerga como um épico necessário e quem o acusa de contar apenas parte da história.



Por que o filme virou fenômeno de bilheteria

Entre os elogios, a produção é celebrada por um realismo militar pouco comum no cinema peruano. As cenas de ação abusam de explosões e armas reais, com consultoria direta de militares que participaram da operação de 1997.

A narrativa, com cerca de 90 minutos, aposta em uma tensão contínua, mesmo que o público já conheça o desfecho. A ação é considerada bem construída e dinâmica por parte da crítica local.

Outro ponto destacado é o foco humano nos soldados. O roteiro procura mostrar fragilidades, medos e laços familiares dos militares, oferecendo uma camada emocional à história de guerra.

Filme Chavín de Huántar narra a operação militar que libertou 72 reféns em 1997 e alcançou o top 5 histórico de bilheterias no Peru, reacendendo o debate sobre versões e lacunas desse episódio

Filme Chavín de Huántar narra a operação militar que libertou 72 reféns em 1997 e alcançou o top 5 histórico de bilheterias no Peru, reacendendo o debate sobre versões e lacunas desse episódio

Foto: Divulgação.


As locações e reconstruções de cenário também chamam atenção: réplicas minuciosas dos túneis e da residência onde ocorreu o sequestro são tratadas como um dos grandes trunfos visuais do longa.

Por fim, há o fator simbólico: o desfecho vitorioso da operação real reforça o orgulho peruano, agora somado à ambição de provar que o país é capaz de produzir filmes de padrão considerado “hollywoodiano”.

Críticas: viés ideológico e lacunas na narrativa

Se, para muitos, o filme é um épico patriótico, para outros ele escorrega em um viés ideológico pró-militares. Uma parcela do público e da crítica acusa a produção de adotar um ponto de vista totalmente favorável às Forças Armadas, sem aprofundar o contexto político e a complexidade do conflito.

O roteiro também é alvo de questionamentos. Diálogos e cenas são apontados como rasos, com personagens que beiram o estereótipo e um tom maniqueísta que, segundo críticos, empobrece o resultado final.

Alguns efeitos especiais são considerados pouco convincentes, e a trilha sonora é vista como exagerada, o que, para parte da crítica, coloca o filme fora de tom em momentos-chave.

Outro ponto sensível é a forma como os reféns são retratados. A calma demonstrada por quem passou mais de dois meses em cativeiro é vista como pouco crível, sem transmitir o pânico e os sofrimentos esperados em uma situação de sequestro prolongado.

Críticos também apontam que outros lados do conflito praticamente não aparecem. Os integrantes do Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA), responsáveis pela ação armada, e políticos da época surgem sem profundidade, com pouca exploração de suas motivações e contradições.

A história real por trás de ‘Chavín de Huántar’

Em dezembro de 1996, militantes do Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA) invadiram a residência do embaixador japonês em Lima. Eles fizeram 72 pessoas de reféns e mantiveram o grupo em cativeiro por 126 dias.

Enquanto a crise se arrastava, militares peruanos cavaram túneis sob a casa, instalaram cargas explosivas e prepararam um ataque coordenado. A operação terminou com a morte de todos os integrantes do MRTA e o resgate dos sequestrados.

O que ficou de fora do filme

A omissão mais comentada pela imprensa peruana é a do então presidente Alberto Fujimori (1938-2024). Sua filha, Keiko Fujimori, criticou publicamente o fato de a produção não destacar o papel do ex-presidente, apontado como responsável por autorizar e coordenar politicamente a operação. Há quem interprete essa escolha como uma tentativa de evitar um viés político explícito na narrativa.

Outras lacunas importantes também chamam atenção. O filme dedica pouco tempo a explicar quem eram, de fato, os sequestradores do MRTA e pouco aborda falhas do Estado em crises anteriores, que ajudariam a contextualizar o episódio.

O diretor e roteirista espanhol Diego de León deixa claro, na forma como constrói a narrativa, que sua prioridade é contar apenas uma história: a dos militares retratados como heróis da operação.

Estreante em longas-metragens, ele vinha de trabalhos em curtas e da minissérie “Los Otros Libertadores”, dedicada a resgatar o papel de heróis da guerra pela independência peruana, entre 1811 e 1828.

Realismo, limitações técnicas e ‘silêncios’ incômodos

A produção aposta no realismo como principal chamariz. Grande parte das explosões é realizada com efeitos práticos, e os atores passaram por um mês de treinamento, orientados por militares que participaram da operação original.

Por outro lado, a pouca experiência de Diego de León em longas ajuda a explicar alguns desacertos de tom e limitações técnicas. Em determinadas cenas, a trilha sonora cresce de forma exagerada em momentos em que o silêncio poderia ser mais eficiente. Já os reféns, como apontam críticos, nem sempre transmitem o medo e o desgaste emocional esperados após 126 dias em cativeiro.

Há uma percepção de que a emoção foi “higienizada” para não competir com o protagonismo de uma narrativa fortemente heroica, centrada nos militares e na dimensão épica da operação.

Entre os pontos mais controversos está o silêncio sobre denúncias de execuções extrajudiciais. Relatos de um médico militar, de representantes da Cruz Vermelha e de um refém japonês indicam que ao menos três integrantes do MRTA teriam sido capturados vivos e mortos posteriormente. O filme não faz referência a essas acusações, nem às inconsistências apontadas na morte de um dos reféns, crítico do governo Fujimori.

Para críticos mais exigentes, “Chavín de Huántar” acerta ao recriar com obsessão o resgate em si, de fato impressionante, mas tropeça nas escolhas sobre o que decide não mostrar. Essas ausências, afirmam, ecoam tão alto quanto a ação estrondosa que conduz a história na tela.

Compartilhar a notícia

V e j a A g o r a